Novas utilizações dos solos rústicos
1.
A transição energética determinada pela neutralidade carbónica que se pretende atingir em 2035, implica a construção de novas unidades de produção de energia por fontes renováveis, nomeadamente, eólica e fotovoltaica, e eventualmente algumas hídricas.
Qualquer destes equipamentos tem de ter uma base territorial e tem que lhe ser exclusivamente dedicada uma determinada área de terreno.
Estimamos que a área de terreno que é necessária, para cada MW de potência instalada, em unidades de produção de energia por fontes renováveis, é de 0,20 ha em hídrica, 0,30 ha em eólica e 2,00 ha em fotovoltaica.
2.
Se, tendo por base os dados publicados pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) relativos a julho de 2022 considerarmos que estão instalados em Portugal 7,3 GW de potência hídrica, 5,6 GW de eólica e 2,2 GW de fotovoltaica, estimamos que estarão neste momento afetos à produção de energia por fontes renováveis 7.500 ha de solos rústicos (sem considerar as áreas para acesso, reservas de água e equipamentos acessórios).
3.
É previsível que área de solos rústicos afetos e equipamentos de produção energia por fontes renováveis aumente nos próximos anos, na medida em que é consensual o objetivo de obtenção da neutralidade carbónica e estão em fase de licenciamento vários equipamentos de produção de energia.
4.
Admitindo a afetação potencial de um terreno rústico à localização de um equipamento de produção de energia por fontes renováveis, colocamos as seguintes questões:
. Qual o valor destes solos?
. É adequado valorizar estes solos tendo por base o modelo tradicional que se traduz em admitir uma “conta de cultura” e considerar que o seu valor é equivalente à capitalização do rendimento que decorre da sua hipotética utilização agrícola ou florestal?
. Deve a valorização dos solos rústicos ter em consideração as novas utilizações potenciais dos solos?
5.
A nossa resposta às questões anteriormente formuladas é a seguinte:
. Qual o valor destes solos?
O valor de um solo rústico no pressuposto da sua afetação a um equipamento de produção de energia por fontes renováveis deve considerar, para além das suas potencialidades agrícolas ou florestais, outros aspetos relacionados com orografia a exposição solar e a proximidade a pontos de ligação à rede elétrica.
Deve também considerar-se na valorização dos solos rústicos o valor económico dos “serviços de ecossistema” e dos “serviços de preservação paisagística”.
. É adequado valorizar estes solos tendo por base o modelo tradicional que se traduz em admitir uma “conta de cultura” e considerar que o seu valor é equivalente à capitalização do rendimento que decorre da sua hipotética utilização agrícola ou florestal?
Quando um solo rústico é afeto a um equipamento de produção de energia por fontes renováveis, o modelo tradicional de valorização dos solos parece desequilibrado, na medida em que coloca todos os benefícios económicos da transição energética do lado das entidades que promovem o investimento, não havendo qualquer benefício desta transição para os detentores dos direitos de propriedade dos terrenos necessários para a sua concretização.
Considera-se adequado e possível, adotarem-se medidas que remunerem os detentores dos direitos de propriedade dos terrenos necessários e as regiões em que os investimentos são realizados, sem comprometer a rentabilidade destes.
No quadro seguinte apresenta-se uma estimativa da receita bruta (sem considerar o investimento) por ha de solo rústico em função da sua afetação. Na medida em que não se considera o investimento realizado, nada se pode inferir sobre o valor dos solos em função da sua afetação. Porém, o valor da receita bruta estimada em 25 anos leva-nos a admitir que no âmbito da transição energética também poderão ser concretizadas medidas que promovam a coesão territorial.
| Valor bruto da produção potencial (€/ha/ano) | Valor bruto da produção potencial em 25 anos (€/ha) |
---|---|---|
Agrícola (culturas arvenses) | 5.500(1) | 137.500 |
Olival em sebe | 5.000(2) | 125.000 |
Florestal – Eucalipto | 780(3) | 19.500 |
Florestal – Montado | 885(4) | 22.125 |
Produção de energia eólica | 115.000(5) | 2.875.000 |
Produção de energia fotovoltaica | 17.500(6) | 437.500 |
(1) admitindo uma cultura plurianual de milho (7.000 kg/ha, 0,25 €/ton) - ferrã (25.000 kg/ha, 0,04 €/ton) e batata (17.500 kg/ha, 0,40 €/ton) - ferrã (25.000 kg/ha, 0,04 €/ton)
(2) considerando 12.500 kg/ha, 400 €/ton
(3) produção de 25 ton/ha/ano, valor do material lenhoso 30,0 €/ton
(4) 7.950 €/novénio; Admitindo 70 árvores/ha, 5 arronas/árvore, 30,0 €/arroba
(5) admitindo 1 ha de terreno p/ 1 aerogerador de 2,5 MW; considerando 2.300h/ano a plena carga e 20 €/MWh
(6) considerando que para 1 MW de potência instalada é preciso 2 ha de terreno; admitindo 1.750 h à plena carga, 20 €/MWh
. Deve a valorização dos solos rústicos ter em consideração as novas utilizações potenciais dos solos?
A nossa resposta é sim. Os equipamentos de produção de energia por fontes de renováveis precisam de uma base territorial e também devem promover o desenvolvimento dos territórios em que se localizam.
Para que seja possível analisar as contribuições que estes investimentos podem destinar à economia local, atente-se que, caso se verifiquem as receitas brutas estimadas no quadro anterior, e não considerando os investimentos quer necessário realizar, as receitas brutas de um ha de terreno afeto a um parque eólico são 150 vezes superiores às de um ha de terreno que esteja afeto à atividade florestal.
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